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SUICÍDIO DE UM CÃO

(Le Petit Journal, 15/5/1866 - Revista Espírita de 1867) 

     Contava o Morning-Post, há dias, a estranha história de um cão que se teria suicidado. O animal pertencia a um Sr. Home, de Grinsbury, perto de Rochester. Parece que certas circunstâncias o tinham como suspeito de hidrofobia e que, por conseguinte, o evitavam e o mantinham afastado da casa tanto quanto possível. Ele parecia experimentar muito desgosto por ser assim tratado e, durante alguns dias notaram que estava de humor sombrio e magoado, mas sem mostrar ainda qualquer sintoma de raiva. Sexta-feira viram-no deixar o seu nicho e dirigir-se para a residência de um amigo íntimo de seu dono, em Upnor, onde recusaram acolhê-lo, o que lhe arrancou um grito lamentável.

     “Depois de esperar algum tempo diante da casa, sem lhe darem entrada, decidiu-se a partir e viram-no ir para o lado do rio, que passa perto de lá, descer a barranca com passo deliberado; depois, voltando-se soltou uma espécie de uivo de adeus, entrou no rio, mergulhou a cabeça na água e, ao cabo de um ou dois minutos, reapareceu à tona, sem vida.

     “Este ato de suicídio extraordinário, segundo dizem, foi testemunhado por grande número de pessoas. O gênero de morte prova claramente que o animal não estava hidrófobo.

     “Tal fato parece muito extraordinário. Sem dúvida encontrará incrédulos. Não obstante, diz o Droit que não lhe faltam precedentes.

     A história nos conservou a lembrança de cães fiéis, que se deram a uma morte voluntária, para não sobreviverem ao seu dono. Montaigne cita dois exemplos, tirados da antiguidade: “Hyrcanus, o cão do rei Lysimachus, seu senhor morto, ficou obstinado sobre sua cama, sem querer beber nem comer, e no dia em que queimaram o corpo, correu e atirou-se ao fogo, onde foi queimado. Como foi também o cão de um tal Pyrrhus, porque não saiu de cima do leito do seu dono desde que este morreu; e quando o levaram, deixou-se levar e, finalmente, lançou-se na fogueira onde queimavam o corpo de seu dono”. (Essais, liv. II, cap. XII). Nós mesmos registramos, há alguns anos, o fim trágico de um cão que, tendo perdido a graça de seu dono, e não achando consolo, tinha-se precipitado do alto de uma passarela no canal Saint-Martin. O relato muito circunstanciado que então fizemos do caso jamais foi contraditado e não deu lugar a qualquer reclamação das partes interessadas”.                                                                                                     

 INÍCIO               PRÓXIMO

Obs.: Não faltam exemplos de suicídio entre os animais. Como se disse acima, o cão que se deixa  morrer de inanição pelo pesar de haver perdido o dono, realiza um verdadeiro suicídio. O  escorpião, cercado por carvões acesos, vendo que não pode sair, mata-se. É uma analogia a mais a constatar entre o espírito do homem e o dos animais. A morte voluntária de um animal prova que ele tem consciência de sua existência e de sua individualidade; compreende o que é a vida e a morte, pois escolhe livremente entre uma e outra. Não é, pois, assim uma máquina, e não obedece, assim, exclusivamente a um instinto cego, como o supõem. O instinto impele a procura dos meios de conservação, e não de sua própria destruição.