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 Voltaire - Foto de pintura obtida em www.wikipedia.org/

 

OS DOIS VOLTAIRES

(Comunicação do Espírito  Voltaire - Revista Espírita de 1862).

     “Sou eu mesmo, mas não aquele Espírito trocista e cáustico de outrora; o reizinho do século dezoito, que dominava pelo pensamento e pelo gênio a tantos soberanos, hoje não mais tem nos lábios aquele sorriso mordaz, que fazia tremer os inimigos e os próprios amigos! Meu cinismo desapareceu diante da revelação das grandes coisas que eu queria tocar e que só as conheci no além-túmulo!

     Pobres cérebros demasiado estreitos para conterem tantas maravilhas! Humanos, calai-vos, humilhai-vos ante o poder supremo; admirai e contemplai - é o que podeis fazer. Como quereis aprofundar Deus e o seu grande trabalho? Apesar de todos os seus recursos, a vossa razão não se quebra diante do átomo e do grão de areia, que não pode definir?

     Eu empreguei a minha vida a procurar conhecer a Deus e seu princípio; minha razão se enfraqueceu e eu cheguei não a negar Deus, mas a sua glória, o seu poder e a sua grandeza. Eu o explicava desenvolvendo-se no tempo. Uma intuição celeste me dizia que rejeitasse tal erro, mas eu não escutava e me fiz apóstolo de uma doutrina mentirosa... Sabeis por quê? Porque, no tumulto e na confusão de meus pensamentos, num entrechoque incessante, eu só via uma coisa: meu nome gravado no frontão de um templo de memória das nações! Só via a glória que me prometia essa juventude universal que me cercava e parecia saborear com suave delícia o suco da doutrina que eu lhe ensinava. Entretanto, empurrado não sei por que remorso de minha consciência, quis parar, mas era tarde. Como toda utopia, todo sistema que abraçamos nos arrasta; a princípio segue a torrente, depois nos arrasta e nos quebra, tão rápida e violenta é por vezes a sua queda.

     Crede-me, vós que aqui estais à procura da verdade, encontrá-la-eis quando tiverdes destacado de vosso coração o amor às lantejoulas, que um tolo amor-próprio e um falso orgulho fazem brilhar aos vossos olhos. Na nova via por onde marchais, não temais combater o erro e o desafiar, quando se erguer à vossa frente. Não é uma monstruosidade preconizarmos um mentira, contra a qual ninguém ousa defender-se, pelo fato de saber-se que fizemos discípulos que ultrapassaram as nossas crenças?

     Vede, meus amigos. O Voltaire de hoje não é mais aquele do século dezoito. Eu sou mais cristão, porque aqui venho fazer-vos esquecer a minha glória e vos lembrar o que fui na juventude e o que amava em minha infância. Oh! como eu gostava de me perder no mundo dos pensamentos! Minha imaginação ardente e viva percorria os vales da Ásia à busca daquele que chamais Redentor... Eu gostava de percorrer os caminhos que ele tinha percorrido. E como me parecia grande e sublime esse Cristo em meio à multidão! Julgava ouvir a sua voz poderosa, instruindo os povos da Galileia, das bordas do Tiberíades e da Judéia!... Mais tarde, nas minhas noites de insônia, quantas vezes me ergui para abrir uma velha Bíblia e reler suas páginas santas! Então minha fronte se inclinava diante da cruz, esse sinal eterno da redenção, que une a Terra ao céu, a criatura ao Criador!... Quantas vezes admirei esse poder de Deus, por assim dizer se subdividindo, e cuja centelha se encarna para fazer-se tão pequena, vindo render a alma no Calvário em expiação!... Vítima augusta cuja divindade eu negava, e que, entretanto, me fez dizer:

     Teu Deus que tu traíste, teu Deus que tu blasfemas.

     Para ti, para o universo, morreu nestes lugares!

     Sofro, mas expio a resistência que opus a Deus. Tinha a missão de instruir e esclarecer. A princípio o fiz, mas o meu facho se extinguiu nas minhas mãos na hora marcada para a luz!...

     Felizes filhos do século dezenove e do século vinte, a vós é que é dado ver luzir o facho da verdade. Fazei que vossos olhos vejam bem a sua luz, porque para vós ela terá radiações celestes e sua claridade será divina!” (Espírito  Voltaire - Revista Espírita de 1862).

  "Filhos, deixei que em meu lugar falasse um dos vossos grandes filósofos, principal chefe do erro. Quis que ele viesse dizer-vos onde está a luz. Que vos parece? Todos virão repetir-vos: Não há sabedoria sem amor nem caridade. E, dizei-me, que doutrina será mais suave para ensinar que o Espiritismo? Nunca eu vos repetiria demasiado: o amor e a caridade são as duas virtudes supremas, que unem, como diz Voltaire, a criatura ao Criador. Ah! que mistério e que laço sublime! ínfimo verme de terra, que pode tornar-se tão poderoso que a sua glória atinge o trono do Eterno!..." (Espírito Santo Agostinho, comentando a mensagem acima).                                     INÍCIO

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